"O Crime do Padre Amaro" de Eça de Queirós (Opinião)
Falar sobre um livro clássico já me dá algum nervosismo, mas ainda por cima sendo um escrito pelo grande Eça de Queirós ainda me intimida mais. Confesso que a minha experiência com literatura clássica portuguesa não é a maior, mas temos de começar por algum lado e este livro foi sem dúvida um desafio.
Ao início custou-me muito entrar no espírito do livro, cansava-me muito rápido da escrita calma do autor, que é bonita e charmosa, mas que em demasia se tornou quase um sacrifício para ler cada página. Acho que a descrição é excessiva, por exemplo, relata o passado de quase todas as personagens ao pormenor quando não era assim tão importante para a história, pelo menos segundo a minha interpretação. Sou capaz de perceber que de certo modo são estas características que o caracterizam, no entanto também não sou obrigada a gostar delas. É uma escrita com críticas quase intemporais, mas o mesmo não se pode dizer do estilo de narrativa descritiva que o autor tem e acho ainda que de certa maneira é mesmo isto que leva a nossa geração a não apreciar as obras de Eça do modo que outrora foram apreciadas.
Eu gostei do enredo que acaba por ser bastante cómico em certas alturas, mas não consegui colocar-me do lado de nenhuma das personagens, porque acho que todas têm os seus defeitos. Por exemplo Amélia, apesar do seu bom coração acaba a agir contra tudo o que sempre defendeu, uma rapariga ingénua que se deixa levar pelo seu frágil coração apaixonado, mas que também nunca fez o esforço de pensar pela própria cabeça, deixando-se sempre influênciar pelos outros. Já Amaro acaba por destruir a vida não só de Amélia, mas também de todos aqueles que a amavam, pois apenas pensava na satisfação dos seus desejos e no quão injustiçado foi ao ser obrigado a tornar-se padre. A crítica à falta de livre arbítrio imposta pela sociedade da altura é muito intensa, bem presente na falta de escolha que Amaro teve, sendo algo que se pode transportar e adaptar muito para os dias de hoje, talvez não tanto em relação à escolha da vida religiosa, mas naquilo que devemos ou não fazer a nível profissional, publicar online e entre muitos outros aspetos.
Gostei muito da personagem do Doutor Godinho, representa o bom senso e a análise imparcial, que apesar de saber as atitudes menos boas dos representantes da igreja desta história, tinha a capacidade de concluir o seguinte, que passo a citar:
"se crês no Deus do Céu, que nos dirige lá de cima, e no pecado original, e na vida futura, precisas duma classe de sacerdotes que te expliquem a doutrina e a moral revelada de Deus, que te ajudem a purificar da mácula original e te preparem o teu lugar no Paraíso. Tu necessitas dos padres."
O Doutor, uma das personagens mais bem instruídas desta história, mostra a importância da Igreja Católica na sociedade aqui representada na pessoa dos padres. Explica que não é pelas ações erradas destes seres humanos imperfeitos (como todos nós somos) que Deus perde a veracidade! Sei reconhecer que a igreja ao longo dos anos cometeu muitos erros, afinal o ser humano é um ser que erra e aprende com esses mesmo erros, mas houve uma coisa em que a igreja não falhou ao espalhar a vida de Jesus Cristo como um guia a seguir! Não é porque este ou aquele padre fazem algo mal que o conceito de Jesus Cristo como o caminho a seguir perde validade, nem pesar! Temos de ser capazes de analisar as situações e perceber que estamos a lidar com humanos que também erram como nós, perceber o que eles fizeram de errado para que nós não façamos igual. Assim estaremos a ser melhores.
Outra questão que quero mencionar é a desvalorização da mulher e Eça consegue mostrar o ridículo da situação usando extremos, uma maneira muito celebre de descrever o quão cómicos eram aqueles homens que criticavam os padres a todo o pormenor e ao mesmo tempo faziam tão mal ou pior na maneira em que diminuiam a posição da mulher em casa, na sociedade e nas relações.
Encontra-se também uma constante falta de formação, um resistência na mudança e inércia relativamente à evolução. Tudo características de um país atrasado, em que as poucas personalidades capazes de mudar esta situação, eram nada mais nada menos que seres dotados de uma arrogância grandiosa e pensamentos de superioridade. Uma população inocente de conhecimento que se deixava levar por esses ditos "sábios", mas que de perspicácia só tinham aquela que os levava para a frente, sem pensar a meio para os fins. Foi neste ambiente que se deu a destruição de Amélia, que na minha opinião representa a destruição da sociedade portuguesa da altura.
Há muito mais a dizer sobre esta obra, um poço de discuções e reflexões, muitas coisas a mencionar em relação à vivência da religião, dos Santos e do dia a dia destas personagens, mas isso terá de ficar para outra altura, senão esta publicação seria quase um pequeno conto 😋
Espero que tenham gostado e adorava saber os pontos em que concordam ou discordam de mim, afinal é mesmo para isso que aqui estamos! Para mais conteúdo há a minha conta do instagram e do youtube, passem por lá 😀 O resto de uma boa semana e fiquem com Deus ❤
Comentários
Enviar um comentário